segunda-feira, 3 de novembro de 2014



As sementes do terrorismo

Zillah Branco *

O início do século 20 foi marcado pela divulgação das ideias democráticas debatidas e aprofundadas desde a Revolução Francesa. O avanço do conhecimento técnico permitiu a circulação rápida das notícias e os debates sobre as lutas sociais.


Os Estados Unidos da América apareceu como vencedor na conquista da independência nacional contra os colonizadores europeus e recebeu dos democratas francesas a estátua da Liberdade que marca ainda o porto de New York por onde entram os imigrantes que sonham com um mundo novo. Novas relações de produção eram criadas para por fim à escravidão, substituída pelo proletariado empobrecido na Europa.

A literatura norte-americana, com Steinbeck, Howard Fast, Michel Moore, e tantos outros que eram capazes de promover a esperança dos que lutam pela superação dos problemas de uma sociedade nova que se constrói a partir dos princípios éticos de um povo heroico que venceu a opressão e o lucro económico gerado pela escravidão e a espoliação nacional. Com os recursos do cinema aquela literatura ganhou uma nova dimensão que se difundiu pelo mundo.
Foi a época dos grandes movimentos sociais, como o das mulheres em defesa dos direitos de cidadania equivalente ao dos homens, o das lutas sindicais por uma legislação do trabalho contra os abusos da exploração capitalista, o da criação da escola pública e da definição de um sistema de saúde pública, que lançavam a base de um Estado Social. A Revolução Russa deu, naquela época, o grande passo para a implantação de um sistema socialista com a abolição de um poder da elite que detinha o controle financeiro nacional.

Contra a força das ideias democráticas que condicionavam nos países capitalistas o poder da elite dominante surgem, então, grupos de oposição que se especializam nos serviços secretos que minam a sociedade por baixo do cenário democrático que levava os povos a despertarem para o seu direito à liberdade e aos benefícios sociais. Esta forma de oposição tornou-se supranacional desencadeando o combate ao socialismo. Nos Estados Unidos a perseguição "mackartista" destruiu livros, filmes, e seus autores; tornou ilegal o Partido Comunista; nos países subdesenvolvidos da América Latina apoiaram governos ditatoriais que seguiram o seu modelo; na Europa desenvolvida encontraram o caminho aberto pelo fascismo que desencadeou as duas grandes guerras mundiais e agiram na sombra.

Com o fim da guerra, vencida pelos aliados capitalistas com o decisivo apoio da União Soviética, a oposição subterrânea multinacional, a que se chamou "imperialismo", detonou a "guerra fria". Com o controle do poder financeiro e militar das sociedades capitalistas, passou a agir por meio da cultura e dos meios de comunicação social na formação mental das populações que se defendiam com o apoio das instituições públicas para assegurar os princípios do bem comum e das organizações de luta por direitos humanos e sociais. A URSS aguentou perto de oito décadas o assédio criminoso constante, enquanto apoiou os povos de todo o mundo na luta pela independência e desenvolvimento dos seus países.

A Alemanha vencida recebeu financiamentos do sistema financeiro capitalista para ressurgir como poder económico e militar e os países mais ricos da Europa foram reconstruídos sob o modelo norte-americano. Foi criado o Estado de Israel em terras povoadas por palestinos com o compromisso de convívio harmonioso o que logo se tornou impossível ao ser transformado em braço armado dos Estados Unidos.

Para a necessária vigilância para garantir a paz mundial e o desenvolvimento equilibrado das nações foi criada a ONU, que tanto defende princípios de Estados Sociais e divulga os conhecimentos científicos e culturais, como mantém a Nato para as intervenções militares que forem consideradas importantes para a estabilidade planetária. Toda essa estrutura seria válida para a implementação da democracia não fosse ser comandada pelas nações mais ricas em defesa dos próprios interesses expansionistas.

Sem entrar na descrição das crises normais ao sistema capitalista, enquanto que a de 1929 foi contornada nos Estados Unidos com um programa de desenvolvimento das infraestruturas nacionais, garantia de empregos aos trabalhadores com o estímulo à produção interna e o combate jurídico aos monopólios empresariais, a crise atual agravou a cobiça do poder imperial (que controla os governos submissos eleitos com o seu apoio) pelas economias populares de nações desenvolvidas impondo cortes orçamentais que comprometem o nível de vida existente e um regime de austeridade que empobrece as populações. Por outro lado, a Nato coordena invasões onde os governantes defendem a autonomia nacional em regiões geoestratégicas dotadas de fontes de riqueza mineral no Oriente Médio e norte da África. Para criar uma aparente justificava para manter em pleno século 21 ações de conquistas bárbaras e prepotentes, como ocorriam há milénios nos primórdios da história da humanidade, as operações militares levam títulos mistificadores de "pacificação" ou de "ajuda a uma população oprimida". Assim foram feitas as guerras na Coreia e no Vietnam pelos EUA.

Na sequência deste comportamento imperial e bárbaro, a cultura subliminar da violência e da alienação que os meios de comunicação social divulgam por todo o planeta afasta as novas gerações das tradições sociais e humanistas dos povos rompendo o equilíbrio familiar e mental do jovem que, em desespero, segue o modelo do herói terrorista que povoa os cenários dentro dos quais são formados.

Não foi por acaso que surgiu uma poderosa seita com o nome de "Estado Islâmico" que destrói, em nome de uma religião originária do Oriente Médio, os povos que ainda defendem o seu direito à autonomia. Estes terroristas surgiram em substituição aos exércitos mercenários que serviram ao poder militar norte- americano quando invadiu e destruiu o Afeganistão e o Iraque, e a NATO que destroçou o Egito e a Líbia, além de provocar guerras civis na Jugoslávia assim como na Síria, Turquia, e em vários países cujos governos ousam afirmar a sua independência. De todos os países europeus têm partido grupos de jovens que, por espírito aventureiro e alienados pela cultura desestruturante dos princípios éticos e do sentido de responsabilidade social, para participarem da fantasia terrorista como se fosse um filme épico ao estilo de Hollyhood.

Esta formação espalha-se pelo mundo e só é contestada pelos movimentos de esquerda e democráticos que têm alcançado momentos de êxito como foi a Revolução dos Cravos em Portugal e o processo de independência hoje em curso na América Latina.

Abaixo reproduzo uma notícia (divulgada pelo site Pragmatismo Político 31/10/14), de Jorge Lima, Jornal GGN, onde se vê o caminho que vem sendo construído pela direita no Brasil na formação cultural de jovens da classe média e no comportamento de instituições de segurança nacional:

"Um ex-aluno do CPOR publicou no Facebook uma foto onde mostra um cartucho de fuzil e diz “Esta é para ti, Dilma”. Estou só esperando o toque da corneta.” O indivíduo vestia um uniforme do Exército Brasileiro, com as insígnias de oficial. Após a foto se tornar de conhecimento público, a conta foi apagada, e, entrevistado, o indivíduo afirmou que era uma brincadeira, e que alguém tornara a foto pública, o que não seria sua intenção. “Foi uma brincadeira. Obviamente, não foi uma coisa legal o que eu coloquei, é ambígua a foto, mas eu não sou terrorista, nunca fiz mal a ninguém”, disse.

Questionados por reportagem do G1, o Ministério da Defesa e a Polícia Federal deram as seguintes explicações: segundo o MD, o autor da ameaça serviu ao Exército em 1998, e não faz mais parte dos quadros da Força. O objeto exposto na foto é um chaveiro, portanto não há razão para que se investigue o fato. O uniforme usado no foto já não é mais usado, e o indivíduo apresenta-se com a barba por fazer, o que fere os regulamentos militares. Já a PF foi mais sucinta, dizendo que não cabe investigação por não se tratar de munição real."

A conivência com a formação terrorista alimenta a difusão de um virus tão ou mais mortífero que o ébola. É urgente o seu combate.


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