segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Os dois Brasis e as mudanças ideológicas


12 DE AGOSTO DE 2012 - 5H52 

Zillah Branco: Os dois Brasis e as mudanças ideológicas


Com a visão econômica predominante nas sociedades modernas, foram apontadas as
diferenças de poder aquisitivo e de qualidade de vida que sempre separaram os ricos dos
pobres no Brasil. 

Por Zillah Branco* 


Essa realidade serviu de guia para as melhores iniciativas de luta secular em defesa dos mais pobres, dos brasileiros que não eram integrados na sociedade como cidadãos de pleno direito, de populações formadas como servidores dos seus conterrâneos privilegiados pela condição de nascimento em uma classe social desprezada pela elite dominante.

A população abandonada pelo sistema - social, econômico e político - dominante no
mundo ocidental desde sempre, vivia no fundo do quintal nacional que só era visitado turisticamente ou para fornecer riquezas naturais extraídas sem qualquer controle científico ou político do Estado Brasileiro. Muitos heróis brasileiros deixaram os privilégios de classe nas cidades para denunciar estas injustiças inaceitáveis, sofreram, foram perseguidos e presos, deram a vida. A galeria de nomes é infinda, mas passa por Luiz Carlos Prestes (capitão do Exército Brasileiro), Monteiro Lobato e Euclides da Cunha (escritores), Chico Mendes (sindicalista), militantes de esquerda e missionários cristãos que foram pioneiros das organizações de solidariedade social que hoje existem e servem de apoio institucional à luta pela transformação democrática nacional.

A resistência à ditadura iniciada em 1964 reuniu todas as diferentes organizações e movimentos democráticos que, com o apoio de numerosos intelectuais e estudiosos da história popular do Brasil, deram grandes passos na conscientização dos cidadãos para implantar a democracia na vida nacional e combater os preconceitos que criavam divisões sociais e econômicas artificiais entre os brasileiros.

Os milhares de militantes que vêm participando dessa luta ideológica, considerando apenas a partir do século 20, mantiveram acesa a chama da dignidade nacional na defesa integral dos brasileiros e das riquezas naturais do território, e cultivaram os princípios éticos e humanistas da filosofia universal.

Nesta luta permanente - que se inicia na educação que forma cidadãos conscientes e
solidários, na coragem do cidadão para preservar a integridade pessoal sob as pressões
da sociedade oligárquica e elitista, que corrompem com falsas informações (publicidade
de vícios, drogas, crimes) e formas de corrupção (distribuição de privilégios e riquezas),
muitas batalhas foram vitoriosas apesar das perseguições e sacrifícios pessoais impostos
pelo autoritarismo e a violência de governantes antidemocráticos. 

Com a eleição de Lula em 2002 estas conquistas democráticas vieram à tona do poder nacional e passaram a impregnar os programas de ação de Ministérios e muitas das instituições do Estado brasileiro que respeitaram a orientação ideológica do presidente da República.

Contradições internas ainda impedem a vigência da democracia institucional
Os dois Brasis ainda existem, com a diferença de que o que antes só foi humilhado e espoliado por um poder oligárquico, minoritário mas detentor do poder no Brasil, formou a sua consciência de cidadania e elegeu governantes que respeitam a democracia e apoiam a luta secular que mobiliza o povo.

A primeira grande conquista foi a elevação da ideologia presente nas lutas populares ao
primeiro plano na República Brasileira, ideologia essa contrária à que anteriormente
defendia princípios de dominação e exploração dos brasileiros mantidos como servidores sem os seus direitos de cidadão.

A elite conservadora hoje não quer ser identificada com este passado histórico que manteve a maioria da população brasileira pobre e humilhada ocupando uma parte do território também abandonado pelo Estado de onde foi roubado o patrimônio natural durante séculos de desmandos governamentais. A democracia tornou-se meta para todos os que querem manter alguma forma de poder no Brasil moderno, a ideologia que Lula e os seus apoiantes levou como meta superior da República Brasileira foi adotada, pelo menos na aparência por alguns e profundamente por aqueles que sempre lutaram por um Brasil melhor e mais justo.

Vemos hoje uma aproximação maior, de personalidades e empresas comprometidos com
a história passada e mesmo com a desastrosa fase do neocapitalismo e que constituiu a
"oposição" partidária liderada pelo PSDB, com a presidenta Dilma do que houve com o presidente Lula. Segundo a opinião revelada por dois ex-presidentes do Banco Central (entrevistados pela Globonews no programa "Entre Aspas" de 24/07/12) "Dilma cria um caminho para o crescimento econômico no Brasil, positivo e sem retorno, que difere do período Lula que era marcadamente ideológico". A mídia tem revelado, da mesma forma,
a satisfação das instituições financeiras com os êxitos do país durante esses anos em que
a crise econômica atinge a Europa e os Estados Unidos.

Assim, sorrateiramente nascem novos conceitos que opõem o "ideológico", considerado como "sonhador, idealista, filosófico e sentimental", ao " econômico, científico, racional, realista", sendo o segundo conceito mais objetivo e maduro que o primeiro que cabe aos poetas e artistas pela sua beleza. Todos estariam do mesmo lado, uns mais capazes que
os outros, por acaso os herdeiros da velha elite oligárquica. Espertos, não?

Com esta conduta pressionam a governança para que se distancie do desenvolvimento real do povo brasileiro e fortaleça os interesses da elite financeira criando uma camada de novos ricos ideologicamente alienada com a fachada de "classe média", portanto a evolução social dos trabalhadores operários e empregados de antes.

Representantes dos dois Brasis conduzem as instituições e a mídia
A fase atual da história do Brasil apresenta duas faces:

1. a realidade que altera a condição de vida e formação da população trabalhadora; e,
em sentido oposto,

2. a afirmação do poder financeiro da elite que conduz a governança do país de acordo
com os interesses que comandam o sistema capitalista.

Os governos de Lula introduziram uma marca ideológica moderna e de esquerda que
incorporou o resultado das lutas sociais que, ao longo da história nacional, combateram
os abusos de poder oligárquico tanto do patronato como das instituições do Estado, introduzindo princípios democráticos já alcançados por outras nações mais desenvolvidas. Ao mesmo tempo, assinalou o fim do poder caracterizado pela ditadura de 1964 e pela experiência neoliberal das últimas décadas do século 20, adotando os caminhos democráticos implantados pelos grupos de resistência ao atraso em que sempre foi mantida a maior parte da população excluída dos direitos de cidadania.

A riqueza desse trabalho de resistência, organizado por expoentes da esquerda partidária e de setores democráticos religiosos e intelectuais, foi valorizada a nível institucional do governo Lula, com a criação de secretarias e comissões específicas federais, estaduais e municipais, conduzidas por militantes de esquerda incorporados à estrutura de poder do
Estado, produzindo os resultados visíveis da opção democrática levada ao poder por Lula.

Os canais televisivos gratuitos, com destaque para NBR e Escola que divulgam os múltiplos trabalhos que são produzidos pelas estruturas da União integradas com outras de nível regional, estadual, municipal, e com a participação dos cidadãos representados por associações próprias, revelam como aquela tradicional resistência de esquerda
aprimorou o seu conhecimento junto às universidades e instituições especializadas e
realiza o trabalho ideológico transformador como se plantasse a semente diretamente no
solo humano brasileiro, junto às Comissões de Moradores ou outras associações, organismos municipais, estaduais, regionais e federais.

Assim, foram aperfeiçoados os programas Fome Zero com a ligação entre a necessária
assistência social para alimentar a população miserável, e a participação das crianças na
vida escolar, a proibição do trabalho infantil, a introdução dos adultos no registro institucional dos cidadãos, o apoio à alfabetização nacional e à formação profissional, a promoção de organizações de cooperativas e microempresas que valorizam os trabalhos artesanais e vencem os atravessadores para chegar ao mercado, introdução de infraestruturas para garantir abastecimento de água, energia, comunicação, que permitem a integração no sistema nacional de desenvolvimento da produção e dos cidadãos brasileiros. Esta é uma estrutura nova e transformadora.

O Estado herdado só foi modernizado no setor financeiro
As instituições de serviços sociais do Estado - saúde, ensino, segurança pública, etc. -
receberam novos e modernos equipamentos e aumentos salariais, mas permanecem obedientes à classe dominante e não atendem a população por incapacidade administrativa e falta de decisão política. Nelas as iniciativas de alguns para ajudar o utente são mal vistas por colegas e chefias que preferem perder o utente diminuindo o esforço para atendê-lo convenientemente que aperfeiçoar os seus métodos de trabalho. O SUS, por exemplo, segundo um especialista entrevistado na TV NBR "mantêm vícios há 20 anos que traduzem um pacto infernal: faltam verbas federais, faltam médicos e pessoal de saúde, os hospitais vão à falência, não há atendimento e o utente morre". Quem depende do SUS pode acrescentar mais uma aberração: como os médicos são mal pagos eles faltam muito ou pedem demissão deixando o cargo vago. O enfermeiro substitui o médico como pode e adquire um status superior que o torna prestigiado. Falta uma organização sistêmica vinculada às particularidades que necessitam a descentralização para se manter ligada à realidade da população local.

Diferentes são as estruturas do Ministério da Fazenda, muito eficientes para que o
cidadão receba todo o apoio necessário para cumprir as suas obrigações fiscais. Ali nota-se
a existência do que falta nos serviços de atendimento social: integralidade, acesso
universal, cortesia, eficiência, fiscalização interna, administração competente. O dinheiro
parece ser um bem mais precioso que a vida dos cidadãos.

A mudança ideológica no comportamento oficial do governo com a criação de novas estruturas e programas de responsabilidade do Estado pelo apoio efetivo ao cidadão nos termos estabelecidos pela Constituição para garantir os direitos democráticos (à vida - saúde, habitação, proteção ao idoso) e à participação social, permaneceu na dependência direta da vontade política dos ministros e altos funcionários responsabilizados pelas ações
programadas com aquele conteúdo inovador publicitado mas sem alterar a conduta das
instituições. Ou seja, tal como antes, a dinâmica permaneceu dependente da decisão
política pessoal e das pressões exercidas pela sociedade através da mídia ou do prestígio
individual.

Na maioria das vezes o "atendimento direto ao cidadão" trata-o como uma peteca, mesmo
que com com gentileza, atribuindo a impossibilidade de atendê-lo às dificuldades devidas à extensão do território, à imensa população, às pressões políticas, à falta de pessoal ou de verba. São desculpas pessoais, de quem não tem poder real, não de um sistema administrativo nacional.

A conclusão a que o cidadão chega é de que o sistema político é inoperante nas formas
democráticas publicitadas, pois as instituições do Estado não atuam com respeito pelos
direitos de cidadania, impõem medidas herdadas de um passado oligárquico, autoritário e
de clientelismo onde o poder assegura a impunidade à elite. Atribui-se vagamente à falta de mudança cultural no mesmo sentido dos discursos democráticos. Creio mais na divisão entre os responsáveis pelos dois Brasis que usam uma linguagem aparentemente semelhante mas com conteúdo conceitual oposto.

A formação cultural, por outro lado, está nas mãos da mídia que goza da liberdade de "formar a opinião pública" incluindo de setores específicos das instituições públicas como as polícias, os juízes e outros intervenientes na condução e análise de processos criminais ou políticos. 

Dentro de todas as casas brasileiras a televisão transmite com riqueza de detalhes, e na forma como seus responsáveis veem, todos os casos passíveis de apreciação oficial antes que as autoridades possam fazê-lo. E mais, compram fotos de elementos participantes de encontros muitas vezes fechados ao público. Uma coisa é a liberdade de expressão e de denúncia que valoriza os agentes midiáticos, outra é a substituição de órgãos oficiais com a antecipada discussão sobre a matéria que cabe ao Estado decidir para "formar opinião pública" e usá-la como pressão.

Para muitos, que dependem do SUS, do INSS, e das demais estruturas oficiais para sobreviver sem padrinhos e privilégios, a experiência concreta hoje é de que o governo que ele defende lembra a ilusão que houve no mundo com o Obama. Se não ficar contra, corre o risco de se considerar apolítico alienando-se da participação social e minando a sua consciência de cidadania. No melhor dos casos verifica que a resistência democrática que existiu sempre e desempenhou sob a ditadura um papel fundamental para o desenvolvimento de uma cultura independente e democrática continua a ser o único caminho válido no Brasil mas precisa ser defendido com maior veemência pelo povo apesar das conquistas eleitorais alcançadas.

* Zillah Branco é socióloga, militante comunista, conselheira do Cebrapaz e colaboradora do Vermelho.


sábado, 4 de agosto de 2012

A solidariedade anônima gera uma cultura humanista



Importante pesquisa do IBGE mostra que no Brasil existem 35 milhões de cidadãos que já exerceram funções de solidariedade junto a instituições sociais ou médicas, dando uma parte do seu tempo para levar apoio e carinho a quem sofre. O número de jovens vem crescendo, principalmente nos hospitais e casas para idosos, prestando serviços gratuitamente como a distribuição de livros e revistas, ou jogos e brinquedos para as crianças, contam histórias e encenam peças de teatro que ajudam a passar o tempo e  criar um ambiente alegre para os que estão em tratamento.

Recordo a presença por todo o país da Pastoral da Criança ensinando as famílias mais pobres a alimentarem os seus filhos com uma farinha fortificante produzida com folhas de grande valor nutricional, casca de ovos moída e produtos de baixo custo. No primeiro domingo de cada mês as voluntárias efetuam a pesagem dos bebês para constatar a superação do risco de subalimentação tão comum no Brasil. Por outro lado, aquela associação desenvolveu uma efetiva campanha para que cada família soubesse combater a desidratação causadora do maior número de mortes nas crianças brasileiras. O seu trabalho foi fundamental para a redução dos óbitos infantis no país.

Em várias escolas públicas existem alunos que se oferecem para ajudar os colegas que têm mais dificuldade nos estudos e até podem repetir a matéria em uma aula de recuperação para vários colegas. Devido aos pedidos dos alunos da Escola Cruzeiro no Rio de Janeiro, foi desenvolvido um projeto com alunos com melhores notas para ajudar os colegas em horas extras.

Os exemplos de solidariedade são incontáveis e ultrapassam a forma apreciada pelo IBGE. Conhecendo a inércia tradicional que mina a maioria dos serviços de atendimento social no Brasil, cria obstáculos "burocráticos" para desprezar a urgência que muitos cidadãos reclamam para solucionar os seus problemas de subsistência e de saúde, merecem a classificação de "militantes da solidariedade humana" os funcionários abnegados que fazem todo o possível para atender com o devido respeito o cidadão necessitado de atenção, por iniciativa própria e mesmo que a administração do serviço permaneça alheia. Estes casos que, felizmente existem, revelam a qualidade de pessoas que assumem a responsabilidade de atender o cidadão que procura o serviço público não pelo salário que recebe nem por qualquer outra forma de compensação, mas  pelos seus princípios humanistas e sociais. Também é comum esta atitude desencadear o desagrado entre colegas e até chefes que estão acomodados na prática, chamada "burocrática", de guardar na gaveta durante anos a reclamação difícil de resolver à espera de que o reclamante desista ou morra.

Diferentes interesses promovem a solidariedade

Como em relação à defesa da natureza, a mídia deu destaque ao interesse pela solidariedade demonstrado por empresários (que deixam a filosofia como tema para a publicidade das iniciativas) e calculam o lucro derivado do trabalho voluntário que agrega valor aos serviços prestados e, ao mesmo tempo, dá uma formação agregada à que o funcionário apresenta: sociabilidade e simpatia, iniciativa e responsabilidade, capacidade de trabalho em grupo, idéias de gestão, administração e disciplina, liderança.

Entrevistada pela Globonews, a presidente da Riovoluntário, com base na referida pesquisa que indicou 5% dos voluntários dando apenas 5 horas por mês, portanto 60 horas/ano cada um, calculou que se trata de 2 milhões e 400 mil voluntários nessa categoria, trabalhando 144 milhões de horas por ano. Supondo o valor mínimo de 20 reais por hora, em um ano serão agregados 2 bilhões e 880 milhões de reais aos serviços de atendimento social, apenas por estes 5 % de voluntários que dispõem de menos tempo que a maioria dos 35 milhões de brasileiros.

Um psicólogo, também entrevistado no programa televisivo "Cidades e Soluções", ressalta o valor da atividade solidária como excelente recurso contra o estado depressivo, na medida em que o voluntário torna-se reconhecidamente útil e bom para os demais.

A internet divulga a história do Centro Voluntário da Vida - CVV - que há 50 anos realiza por telefone um trabalho de prevenção do suicídio em que o voluntário aprende a dialogar com quem está em desespero e trabalha para o dissuadir da morte aprimorando a sua iniciativa de ajudar o outro.

A história do voluntariado no Brasil

O modelo padrão, tradicional, de ação voluntária está vinculado às práticas das diferentes seitas religiosas. De fato, na história do Brasil, foram os Jesuítas que primeiro introduziram esta prática social, com a promessa de compensações divinas pelo trabalho gratuito e, para os jovens, a formação profissional. O interesse dos religiosos, fosse no aproveitamento de uma mão de obra gratuita ou apenas paga com a alimentação ( melhor situação do que a escravidão), fosse na caridade da preparação de indígenas marginalizados para a aculturação e inserção social, era regido pelas crenças cristãs da época, inclusive com as ameaças de punição divina.

Mais tarde surgiram outras seitas cristãs, católicas e protestantes, que marcaram com as suas diferenças internas a conduta em relação ao ensino e aproveitamento do espírito de solidariedade. Também seitas espíritas e de religiões africanas e asiáticas foram surgindo na sociedade brasileira e fazendo uso similar da promoção da solidariedade que alcança um valor épico junto à coletividade que a experimenta. Mas a formação humanista nem sempre foi de inspiração religiosa. O sentimento patriótico e de solidariedade comunitária deu origem às manifestações de resistência política e social que marcou a história nacional. A Coluna Prestes, durante dois anos saiu do Rio Grande do Sul e percorreu o interior nordestino do Brasil em defesa das populações rurais abandonadas pelo sistema republicano vigente. Foi uma experiência guerrilheira que revolucionou a estratégia de luta revolucionária, mais tarde utilizada em outros países com grande êxito para o processo socialista, e serviu de alavanca ideológica no Brasil para ultrapassar os limites políticos do domínio ruralista latifundiário, caracteristicamente elitista e egoísta.

Os valores que os empresários modernos apregoam - de formação do indivíduo mais capaz e com auto-controle - tornou-se incentivo à promoção dos mais bem sucedidos na hierarquia dos servidores das igrejas (o heroísmo de alguns inspirou as santificações), assim como no plano político e social na formação de líderes.

No século XIX a militância política de diferentes tendências ideológicas e de movimentos específicos de lutas sociais, desenvolveram a prática da solidariedade social substituindo os estímulos religiosos anteriores pela construção de uma nova sociedade mais justa apoiada na formação humanista dos militantes contrários ao egoísmo individualista da elite dominante.

Qualquer que seja a motivação para a produção de serviços sociais, religiosa ou filosófica, com interesses pessoais de promoção pessoal ou desinteressados, a solidariedade introduz na organização da sociedade uma contribuição positiva de caráter democrático e humanista que contraria os princípios filosóficos do sistema capitalista.

Objetivos egoistas embutidos em valores altruistas

Para "reformar" o sistema capitalista, a tendência social-democrata criou uma versão do "capitalismo humanitário" que se apropriou de conceitos de cooperativas, participação popular, solidariedade comunitária, amplamente aplicados nos programas internacionais do Banco Mundial, da FAO e outros organismos da ONU.

Sob estas orientações formalmente humanistas, foram feitas experiências nos países mais pobres da América Latina, África e Ásia, que obtiveram êxito inicial devido aos investimentos aplicados mas a médio e longo prazo promoveram graves desastres naturais e sociais devidos ao peso da exploração financeira que está no cerne da ideologia capitalista. Hoje são revelados os gravíssimos problemas ( previstos por especialistas que não foram ouvidos)  de destruição do solo na India durante a Revolução Verde, pulverização da união política entre trabalhadores rurais em países onde foram realizadas Reformas Agrárias com a divisão das propriedades de agricultura extensiva em micro explorações familiares, incentivo a cooperativas que encerram condições de sociedades submetidas ao poder econômico destruindo os laços de solidariedade entre os cooperantes e quebra das tradições culturais equilibradas com as condições naturais e humanas existentes na região.

A verdadeira solidariedade exige um comprometimento com a possibilidade de apoiar os grupos humanos carenciados no seu desenvolvimento para que possam alcançar melhores condições de ida sem perderem a sua independência e as características culturais que formam a sua personalidade. Doações externas podem ser positivas, mas não têm o valor da solidariedade porque podem ser apenas uma "compra" disfarçada.

                Zillah Branco